Soja: história, características do grão e dicas para novos produtores

História da soja

A soja (Glycine max) cultivada hoje é diferente das ancestrais, que eram plantas rasteiras que cresciam no leste da Ásia, ao longo do rio Yangtse.

A planta evoluiu com o aparecimento de cruzamentos naturais entre duas espécies de soja selvagem que foram domesticadas e melhoradas por antigos estudiosos chineses.

As primeiras citações sobre a oleaginosa aparecem no período entre 2883 e 2838 AC, quando a soja era considerada o “grão sagrado”, ao lado do arroz, trigo, cevada e milheto

Apesar de ser conhecida e consumida pela civilização oriental, só foi introduzida na Europa no final do século XV.

Na segunda década do século XX, os estudos evidenciando o teor de óleo e proteína da soja começaram a despertar o interesse das indústrias mundiais.

A soja no Brasil

No final da década de 1960, dois importantes fatores internos fizeram o Brasil começar a enxergar a soja como um produto comercial. Na região Sul, a soja surge como uma opção para a safra de verão, na sucessão ao trigo. Além disso, também se iniciava um esforço para produção de proteína animal, principalmente suínos e aves, gerando demanda por farelo de soja para fabricação de ração.

Em 1966, a produção comercial de soja se estabelece como uma necessidade estratégica, sendo produzidas cerca de 500 mil toneladas. A explosão do preço do grão no mercado mundial, na década de 1970, despertou mais interesse nos agricultores e no próprio governo brasileiro.

Dessa forma, o país se beneficia de uma vantagem competitiva em relação aos demais produtores: o escoamento da safra brasileira ocorre na entressafra americana, quando os preços atingem as maiores cotações. A partir daí o Brasil passou a investir em tecnologia para adaptação da cultura às condições brasileiras, processo liderado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

Pesquisas levaram à chamada "tropicalização" da soja, permitindo que o grão fosse plantado com sucesso em regiões de baixas latitudes, entre o Trópico de Capricórnio e a Linha do Equador.

Atualmente, os líderes mundiais na produção de soja são os Estados Unidos, Brasil, Argentina, China, Índia e Paraguai.

Como iniciar o plantio da soja

É necessário conhecer bem a planta e ficar atento as práticas como semeadura, manutenção, manejo, colheita e armazenamento.

A soja é uma espécie herbácea da família Fabaceae. Possui sementes de germinação epígea e sistema radicular do tipo pivotante, com uma raiz principal e inúmeras ramificações.

Existe hoje no mercado uma grande variedade de cultivares de soja, sendo que a duração total do ciclo da cultura varia de 100 a 150 dias, predominantemente com 115 a 125 dias nas cultivares comerciais mais comuns.

Para qualquer cultura que se queira implantar comercialmente é fundamental que haja um planejamento e na soja não é diferente. Com isso é possível minimizar problemas futuros, como o aparecimento de pragas e doenças, por exemplo.

É necessário conhecer o histórico da área para projetar o plano de manejo eficiente de adubação, controle de pragas, doenças e plantas daninhas.

Na escolha da cultivar, é importante optar por aqueles com alta produtividade, que sejam adaptados às condições climáticas da região do plantio e resistentes a pragas e doenças. Também é muito importante ter em mãos um levantamento das máquinas e implementos necessários no plantio.

A partir destas informações, é possível realizar um plano de ação condizente com a realidade e aptidão da área, e iniciar o plantio da soja. No planejamento, deve-se acompanhar detalhadamente os custos da produção.

Escolha e preparo do solo

Um dos principais fatores a ser considerado é a qualidade do solo no local do cultivo.

Além disso, a escolha da área deve ter características de clima e relevo favoráveis à cultura e deve-se observar a qualidade física, química e biológica do solo.

Os solos brasileiros possuem enorme potencial produtivo, entretanto, para que este potencial seja expresso em produtividade das culturas deve-se pensar na condução de um sistema sustentável a longo prazo. Não é possível estruturar um solo física, química ou biologicamente de um dia para o outro, é necessário planejamento.

Para tanto, é fundamental uma análise do solo, que permita estabelecer as melhores formulações de fertilizantes e corretivos, em qualidade e quantidade para se conseguir sucesso no desenvolvimento da cultura ao longo da safra. A análise de solo é fundamental como ferramenta para tomada de decisão correta em adubação e calagem (aplicação de calcário para correção do solo).

Há duas formas de fazer análise de solo, a convencional (imagem abaixo) e com agricultura de precisão.

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Já a amostragem de solo com agricultura de precisão utiliza GPS em plantadoras, implementos e colhedoras para georreferenciar a área e aplica técnicas de geoestatística e mapas de variabilidade espacial para fazer a correção do solo, em taxa variável. Ou seja, aplica a quantidade específica demandada em casa talhão ou região delimitada e não uma média em toda área a ser plantada.

Na análise de solo é muito importante a escolha de um laboratório de confiança, licenciado e com bons resultados já entregues ao setor.

O que são cultivares de soja?

As cultivares são um conjunto de plantas da mesma espécie, cultivadas, que se diferenciam por características importantes para a agricultura, e que quando se reproduzem mantêm todas estas características. Na soja, uma cultivar com as características desejadas para ter mais resistência e produtividade, resulta de programas de melhoramento genético. Há vários tipos de cultivares no Brasil adaptados para determinadas regiões produtoras.

Você deve escolher uma ou mais cultivares de soja para a sua lavoura.

A ferramenta Zarc (Zoneamento Agrícola de Risco Climático) minimiza os riscos relacionados aos fenômenos climáticos adversos e auxilia a identificar, por município, a melhor época de plantio das culturas, nos diferentes tipos de solo e ciclos de cultivares. Na escolha da cultivar é importante considerar fatores como:

  • Época de plantio;

  • Tipo de solo;

  • Condições climáticas da região;

  • Histórico da área;

  • Resistência/tolerância da cultivar a herbicidas, pragas e doenças;

  • Ciclo da cultivar;

  • Tolerância a estresse hídrico;

  • Produtividade.

Tipos de cultivares de soja no Brasil

Atualmente, existem mais de 2 mil cultivares de soja registradas no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

A seguir veremos as três principais tecnologias das cultivares de soja mais plantadas no Brasil:

Cultivares de soja RR

Possuem a tecnologia Roundup Ready e são resistentes ao glifosato.

A tecnologia RR está presente em mais de 96% das cultivares de soja disponíveis no mercado nacional.

Cultivares de Soja Intacta

Esta tecnologia representa a combinação de três soluções em um único produto: tolerância ao herbicida glifosato, controle das principais lagartas que atacam a soja e alta produtividade.

A junção da resistência ao glifosato com a facilidade de manejo de um complexo específico de lagartas pragas proporciona diminuição no uso de agrotóxicos.

Cultivares de soja convencional

Sem modificações, ou seja, livre da tecnologia dos organismos geneticamente modificados (OGM), a soja convencional possui um melhoramento genético tradicional.

Com alto potencial produtivo, a soja convencional vem recuperando o seu espaço no mercado e se tornando uma opção atraente para o produtor.

Além disso, o uso de cultivares convencionais também pode diminuir os custos da lavoura, pelo fato do produtor não precisar pagar royalties às empresas que desenvolveram as outras variedades.

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Tratamentos de semente

Sementes com alta qualidade sanitária são aquelas livres da presença de fitopatógenos e que apresentam alto poder germinativo e de vigor.

O tratamento de sementes é uma técnica que tem por objetivo assegurar a qualidade sanitária das sementes, por meio da aplicação de produtos químicos ou biológicos eficientes para controlar fitopatógenos, principalmente fungos associados às sementes ou presentes no solo, além de atuar contra o ataque inicial de pragas específicas do solo, protegendo as plântulas durante o processo germinativo e de emergência.

Sistemas de plantio

Plantio direto

Caracteriza-se pela manutenção do solo coberto durante todo o ano e com o revolvimento do solo somente na linha de semeadura (Vargas et al., 2004).

A rotação de culturas, que contribui para a redução de insetos-praga e doenças, deve sempre fazer parte do sistema de plantio direto (Galerani, 1994).

Com esse sistema, tem-se maior controle da erosão e manutenção da umidade no solo, diminuindo as perdas de solo por erosão e aumentando a proteção física da matéria orgânica no interior dos agregados (Bayer; Mielniczuk, 1997). No plantio direto, as plantas de cobertura de outono/inverno assumem uma importância fundamental porque promovem aumento da matéria orgânica junto à superfície do solo (Vargas et al., 2004).

Sistema convencional

Caracteriza-se pela inversão da camada superficial e pela incorporação dos resíduos durante as operações de preparo do solo (aração e/ou gradagem). Com isso há distribuição mais uniforme da matéria orgânica e dos nutrientes no perfil do solo aumentando a diferença térmica do albedo (Alvarez et al., 1995).

O preparo excessivo causa destruição irreversível da estrutura do solo, favorece a compactação e pode diminuir a produtividade (Debiasi et al., 2013).

Efeitos atribuídos às culturas que mantêm as comunidades microbianas do solo, podendo favorecer a sanidade das plantas.

Manejo de pragas

O Manejo Integrado de Pragas (MIP) é um conjunto de tecnologias que utilizado harmonicamente permite a condução da lavoura por meio de táticas sustentáveis de controle de pragas (que inclui o uso racional de inseticidas), que são aplicadas apenas quando necessárias e economicamente viáveis. O uso de controle biológico também está inserido no MIP. É imprescindível que o produtor plante o refúgio, faça o MIP em toda área, realize um bom manejo de plantas daninhas e tenha atenção às tecnologias de aplicação.

Colheita da soja

A colheita da soja é um momento de extrema importância, e exige muito planejamento do produtor. Se for feita fora da janela adequada, pode ocasionar em menor produtividade, além de comprometer o plantio da safra que virá na sequência.

É fundamental que todas as operações de colheita sejam planejadas, evitando que os grãos fiquem expostos às condições climáticas indesejáveis. É preciso fazer a revisão e planejamento logístico dos maquinários, além o acompanhamento do clima e fenologia da soja, para garantir a colheita no ponto ideal.

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Momento ideal de colheita da soja

A colheita deve ser feita conforme o ciclo de cada cultivar.

  • Entre janeiro e abril nas regiões do Centro-Oeste e Nordeste.

  • A colheita de soja precoce em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul em janeiro e fevereiro possibilita a semeadura da segunda safra, como o milho safrinha.

Na prática, é recomendável que a colheita da soja seja realizada logo após a maturidade fisiológica do grão, quando cessa o transporte de nutrientes para o grão e chega ao acúmulo máximo de matéria seca, com as melhores condições fisiológicas.

Mas tem um entrave, nesse período, a soja se encontra com alta umidade e presença de ramos e folhas verdes, o que impossibilita a colheita mecanizada. Para resolver isso, realiza-se o manejo de dessecação, utilizando-se herbicidas específicos, para diminuir o período em que os grãos ficam no campo expostos a condições climáticas adversas, pragas e doenças.

O produtor deve realizar a dessecação no estádio R7da cultura, logo após o ponto de maturidade fisiológica, quando pelo menos uma vagem está com coloração madura na haste principal.

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Para onde e como vender a produção

Quem são os compradores

  • Indústrias: empresas compram o grão para a produção de alimentos industrializados, utilizando o farelo e o óleo de soja. Podem também atuar como trading;

  • Tradings: empresas que intermediam a negociação entre produtores e compradores nacionais e internacionais. Normalmente, o produtor negocia vendas ao exterior com as tradings ou corretoras de tradings. Na maioria dos casos, as tradings realizam as compras nos portos.

  • Cooperativas: as cooperativas compram a soja para utilização em seus produtos como ração ou para negociar em lotes com tradings, indústrias ou compradores internacionais;

  • Cerealistas: têm atuação muito parecida com a das cooperativas. Os cerealistas podem atuar tanto como intermediários ou como produtor de alimentos;

  • Empresas de insumos: esse tipo de negociação serve basicamente para trocas, o chamado barter. O produtor troca os insumos agrícolas pela produção de soja.

Modalidades de venda

  • Balcão: entrega na moega. A empresa compradora assume a responsabilidade por classificar os grãos, limpar e secar a oleaginosa;

  • Spot ou soja disponível: o produtor assume a responsabilidade de secar e limpar os grãos. A função da compradora é apenas receber o produto e processar;

  • Lotes: antigamente servia para se referir a negociações entre empresas. Mas como o Brasil possui grandes produtores, agora a venda em lotes serve para se referir a vendas em grandes quantidades;

  • **Mercado futuro:**As negociações de mercado futuro são para garantir o patamar de preços em um momento que o produtor considera bom. Os sojicultores utilizam o mercado futuro para garantir a cobertura dos custos de produção como forma de se capitalizar para investir na lavoura;

  • Hedge: o objetivo dessa operação é proteger o valor de um produto em uma data determinada. A chamada “trava” é uma forma de o produtor se garantir diante de volatilidades ou de um cenário de perdas de preços. Negociação que envolve Bolsa de Valores, riscos mais altos e dependendo da aposta do produtor;

  • NDF (Non-Deliverable Forward): o NDF é uma forma de negociação parecida com o hedge, mas não envolve contato direto com a Bolsa de Valores, a transação é feita por meio de um banco ou corretora. O banco assume os riscos da operação em troca do pagamento de juros. Não envolve entrega física;

  • Prefixação: negociação do produtor com alguma empresa ou cooperativa em que o sojicultor “trava” os preços da data e se compromete a entregar fisicamente o grão;

  • Pré-pagamento: o comprador adianta o pagamento em dinheiro para o produtor, que se compromete a entregar o produto fisicamente. Nessa modalidade há cobrança de juros.

  • Barter: troca de sacas de soja por insumos. É uma negociação pré-fixada em que o produtor antecipa a remuneração da soja para conseguir os insumos para a safra. É uma operação que não envolve dinheiro diretamente, apenas o produto;

  • Venda a fixar: pouco utilizada, para momentos de preços ruins da soja. O comprador antecipa o pagamento da mesma forma, mas a negociação desconta juros até a entrega do produto. O que restar entre o antecipado e os juros cobrados vira a remuneração do agricultor.

Modalidades de entrega

  • FOB (Free on Board): o comprador assume as responsabilidades pelo transporte do grão até o porto, tanto na questão de perdas e danos. Desconta-se da remuneração as taxas portuárias e o frete e tem uma cotação menor;

  • CIF (Cost, Insurance and Freight): a responsabilidade pela entrega é do vendedor, sendo ele quem paga os custos de frete e operação portuária. Os riscos e o seguro da mercadoria também são pagos pelo produtor. A remuneração costuma ser maior que na modalidade FOB.

Remuneração

  • Praças: quando divulgamos as cotações de porto e das principais praças do interior do país, elas são apenas uma referência de remuneração;

  • Volume de negociação no mercado interno: as negociações no mercado interno são baseadas em sacas de 60 kg. Já para exportação, a negociação é em toneladas ou bushel (27,2 kg).

  • Composição de preços: a composição de preços com base na cotação na Bolsa de Chicago (EUA), a cotação do dólar e o prêmio. O comprador desconta os custos com operação portuária, impostos e frete. Calculando esses dois lados, as indústrias e empresas formam o preço da soja;

  • Prêmio: o prêmio é uma remuneração extra para a entrega da soja para exportação. O pagamento de prêmios é negociado entre tradings e os compradores internacionais, com base de cálculo em uma porcentagem da cotação de Chicago, descontando os custos logísticos.

Referências

  • ALVAREZ, R.; DÍAZ, R.A.; BARBERO, N.; SANTANATOGLIA, O.J.; BLOTTA, L. Soil organic carbon, microbial biomass and CO2-C production from three tillage systems. Soil and Tillage Research, v. 33, p. 17-28, 1995.

Agriconline

AGROPOS

BAYER, C.; MIELNICZUK, J. Características químicas do solo afetadas por métodos de preparo e sistemas de cultura. Revista Brasileira de Ciência do Solo, v. 21 p. 105-112, 1997.

Coopertradição

CLIMATEFIELDVIEW

DEBIASI, H.; FRANCHINI, J. C.; CONTE, O.; BALBINOT JUNIOR, A. A.; TORRES, E.; SARAIVA, O. F.; OLIVEIRA, M. C. N. de. Sistemas de preparo do solo: trinta anos de pesquisas na Embrapa Soja. Londrina: Embrapa Soja, 2013, 72 p. (Embrapa Soja. Documentos, 342).

Embrapa

GALERANI, P. R. Cropping systems and rotations. In: EMBRAPA. Centro Nacional de Pesquisa de Soja (Londrina, PR). Tropical soybean: improvement and production. Rome: FAO, 1994. p.145-152. (FAO Plant Production and Protection Series, 27).

VARGAS, L. K., SELBACH, P. A.; SÁ, E. L. S. de. Alterações microbianas no solo durante o ciclo do milho nos sistemas plantio direto e convencional. Pesquisa Agropecuária Brasileira v. 39, p. 749-755, 2004.

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Henrique Servolo

Engenheiro Agrônomo, Mestre em Fitotecnia e Doutor em Engenharia florestal, todos pela Esalq/USP.

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