Glifosato: O que é, para que serve e quais os riscos para a saúde
História do Glifosato
A molécula do glifosato foi sintetizada pela primeira vez pelo químico suíço Dr. Henri Martinpelo no ano de 1950, numa tentativa de desenvolvimento de um medicamento para uso farmacêutico, mas o resultado não foi bem-sucedido.
Vinte anos depois, Dr. Phil Hamm e Dr. Franz, nos Estados unidos, num programa de desenvolvimento de um herbicida sistêmico pela empresa Monsanto, hoje pertencente à Bayer, descobriram a atividade herbicida do glifosato e que o produto era eficiente para eliminar plantas daninhas, o que levou ao patenteamento dessa molécula com o nome comercial de Roundup, em 1974.
Neste ano, produto, agora como herbicida, foi lançado em três países: EUA, Reino Unido e Malásia, sendo inicialmente direcionado para vinhedos, florestas e seringais, considerados novos mercados pela empresa.
O produto se tornou um agrotóxico popular na década de 1990 com o lançamento de uma linha de sementes transgênicas. Contudo, seu uso de forma inadequada tem sido associado à contaminação do solo e de lençóis freáticos, bem como ao desenvolvimento de câncer, levando à proibição de sua aplicação em diversos países.
Em 1996, a empresa Monsanto, detentora da patente dessa molécula, lançou a soja transgênica tolerante ao glifosato (RoundupReady).
Este lançamento marcou uma nova era no controle das plantas daninhas na cultura da soja, pois tornou possível usar esse herbicida eficiente e de amplo espectro na lavoura já emergida.
Para que serve o glifosato?
Apesar de ter sido utilizado para limpar metais e sintetizado pela primeira vez como um medicamento, como citamos acima, a utilização mais consagrada do glifosato é como herbicida não seletivo, pois é capaz de eliminar praticamente qualquer planta com a qual entra em contato.
O glifosato é um herbicida sistêmico de amplo espectro e dessecante de culturas.
É um composto organofosforado, pertencente ao grupo químico dos aminoácidos fosfonatos e tal como seu precursor, a glicina, apresenta comportamento zwiteriônico, com separação de duas cargas em pH neutro, uma positiva no grupo amino e uma negativa no grupo fosfonato.
É usado para matar plantas daninhas, especialmente as folhosas perenes e gramíneas que competem com as culturas principais.
A substância química glifosato é utilizada como princípio ativo de diversos defensivos agrícolas (agrotóxicos) e um composto organofosforado.
Como a patente do produto expirou em 2000, atualmente existem mais de 100 agroquímicos que utilizam essa molécula.
Ao ser absorvido, principalmente, pelas folhas das plantas daninhas, o agroquímico impede que os vegetais sintetizem as proteínas necessárias para seu crescimento, o que acaba levando essas plantas à morte.
Qual a diferença entre Roundup e glifosato?
Roundup foi a marca comercial da primeira patente de glifosato.
No Brasil, o produto é fabricado pela Bayer, que adquiriu a Monsanto, mas outras 50 empresas têm registro para a comercialização de produtos com esse princípio ativo.
O herbicida é vendido em mais de 130 países, sendo o defensivo agrícola mais popular do mundo.
Como é utilizado o glifosato?
A substância química elimina plantas invasoras de qualquer espécie para proporcionar um desenvolvimento melhor da cultura plantada na mesma área.
O glifosato tornou possível a técnica de plantio direto, no qual uma nova safra é planada sem se revolver o solo e sobre a cobertura vegetal deixada pela anterior, e seu uso foi impulsionado pelo surgimento da soja transgênica.
O glifosato atua no controle das plantas daninhas e dos restos vegetais de rotação de culturas. A substância também auxilia na decomposição de materiais orgânicos, contribuindo para a melhoria do solo a partir da reciclagem de nutrientes.
O defensivo agrícola, ao ajudar a formação da cobertura vegetal morta, proporciona benefícios como maior produtividade, redução de custos no uso de outros agroquímicos e fertilizantes, maior proteção contra o impacto das chuvas e erosão e melhor infiltração da água.
Tempo de ação do glifosato
O glifosato provoca amarelecimento progressivo das folhas, murcha e posteriormente necrose e morte das plantas.
Esses sintomas aparecem entre 4 e 15 dias após a aplicação, e variam conforme a condição de operação, clima e planta.
Para qual tipo de planta é indicado?
O glifosato mata todas as plantas sem seletividade, e sua ação é basicamente longa, demorando por volta de 15 dias para demostrar suas ações no campo.
Apesar desse herbicida ser sucesso hoje, no início não foi instantâneo, pois na época não havia plantas geneticamente modificadas e resistentes à sua ação, e o glifosato matava todas as culturas.
Mas, alguns fatores fizeram com que os produtores passassem a utilizar a molécula, como:
- Grande adsorção ao solo;
- Baixa toxicidade;
- Elevada eficácia.
Por quanto tempo o glifosato fica no solo?
A meia-vida do glifosato no solo varia de menos de uma semana até alguns meses, dependendo dos teores de argila e matéria orgânica e do nível de atividade microbiana (TONI et al., 2006).
Já Wauchope et al. (1992), relata que a meia-vida pode chegar a 174 dias.
Riscos do glifosato para a saúde a saúde e o meio ambiente
Houve, em 2018, uma reavaliação toxicológica do glifosato, motivada por novos e atualizados estudos, inclusive da OMS (Organização Mundial da Saúde), envolvendo seus efeitos para saúde humana.
No Brasil, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) demorou para reavaliar molécula e nesse meio tempo o Tribunal Regional Federal suspendeu o registro de produtos à base de glifosato, além da comercialização em todo Brasil.
Com as agências internacionais concluindo que os herbicidas à base de glifosato eram seguros para a saúde humana, desde que os resíduos em alimentos sejam baixos, ficou registrada a importância de estudos desses teores nos alimentos, e do respeito às dosagens registradas de aplicação e tempo de residual. O manejo adequado e bem orientado também é fundamental.
Dessa forma, a Anvisa concluiu, em 2019, que o glifosato “não apresenta características mutagênicas e carcinogênicas”, liberando a molécula para utilização, o que vale até hoje.
Para avaliar o efeito do glifosato no ambiente, deve-se considerar a ação na água, ar, solo e organismos associados, pois a maior parte do herbicida fica nas plantas e é absorvido por elas. O que não é interceptado vai para o solo, a molécula fica ali disponível a reações químicas e degradação pelos organismos.
Estudos sugerem que o glifosato se adere ao solo rapidamente, ficando praticamente imóvel, sendo que o resíduo fica no solo até se degradar completamente
Os micro-organismos são os principais responsáveis pela degradação do glifosato.
Em aproximadamente um mês, metade da molécula é metabolizada e não há comprovação sobre o efeito adverso a estes organismos.
A presença de glifosato no ar é quase nula, pois os sais dificilmente volatilizam para a atmosfera, mas em áreas tratadas constantemente com o produto, gotículas podem estar presentes no ar.
Portanto, deve-se respeitar o intervalo de 24 horas para a reentrada de pessoas nas áreas em que o herbicida foi aplicado.
É necessário respeitar todas as orientações do uso de qualquer substância química, não sendo diferente para o uso de glifosato.
Características importantes do glifosato
- O glifosato é classificado como não seletivo, ou seja, elimina praticamente todas as plantas.
- Tem amplo espectro de controle: controla diversas plantas daninhas, de folha estreita e larga.
- As formulações Roundup Transorb e Zap Qi apresentam penetração foliar mais rápida do que as demais existentes no mercado brasileiro.
- Promove a morte das plantas lentamente, entre 7 e 15 dias após a aplicação.
- É classificado como herbicida sistêmico, ou seja, se move dentro da planta.
- Importante para manejo: não apresenta atividade no solo, por isso é usado somente em pós-emergência das plantas daninhas.
- A utilização de água de pulverização com muito cálcio e magnésio reduz a atividade do glifosato.
A classificação toxicológica varia de acordo com a composição das formulações dos produtos que contêm glifosato.
Nível de toxicidade de algumas formulações:
Classificação de herbicidas glifosato (Fonte: Rodrigues e Almeida, 2018)
- É também utilizado para controle de plantas daninhas em áreas não-cultivadas como rodovias, ferrovias, parques industriais, etc.
- O glifosato é o principal facilitador (dessecante) do plantio direto.
- Em culturas perenes, como café, frutíferas e reflorestamento, as aplicações são dirigidas, sendo somente pulverizado na entrelinha para não atrapalhar o desenvolvimento das culturas (diminuir estresse).
- Já que não é seletivo, só pode ser aplicado em culturas não perenes geneticamente modificadas para tolerar a molécula.
- É pouco volátil, ou seja, dificilmente haverá problemas com deriva (escape para áreas vizinhas), mas o manejo de aplicação se torna importante para que isso não ocorra.
- É uma molécula altamente solúvel em água.
Problemas de tolerância e resistência de plantas daninhas ao glifosato
Algumas plantas daninhas são tolerantes ao glifosato, ou seja, são de difícil controle.
O que é tolerância natural?
É uma característica natural, ocorre sem que a planta tenha entrado em contato com o produto.
O que é tolerância adquirida?
Quando as plantas daninhas resistentes aos herbicidas são selecionadas, por uso inadequado de um produto ou por uso constante de um I.A. (ingrediente ativo) sem alternância de produtos.
Mundialmente, o glifosato fica em terceiro lugar em casos de plantas daninhas resistentes - em primeiro lugar temos os herbicidas inibidores da ALS e em segundo, o grupo químico das triazinas (Inibidores do Fotossistema II).
A maioria dos relatos de plantas daninhas resistentes aos inibidores de EPSPs (grupo do glifosato), tem relação à soja e ao milho, causando grande preocupação.
Esse problema está diretamente ligado ao uso intensivo da molécula nas lavouras com cultivares transgênicas. Esse uso intensivo ocorre pelo fato de ser um produto barato, com baixo risco e alta eficiência. Mas, como consequência, pode ocorrer uma pressão de seleção de plantas resistentes.
O glifosato é considerado como extremamente importante na agricultura, especialmente por viabilizar o plantio direto, prática agrícola importante e sustentável.
No entanto, é necessário planejar as aplicações, fazendo a rotação de modos de ação dos herbicidas e utilizar outros métodos de controle.
Fonte: International Survey of Herbicide Resistant Weeds
Fonte: blog Syngenta digital
Vantagens do uso do glifosato
Antes de utilizar qualquer produto, é muito importante considerar seus pontos positivos e negativos. Como vantagem o glifosato apresenta :
- Baixo teor de agentes químicos;
- Controla diversas espécies em tempo considerado curto;
- Não é volátil e pouco móvel no solo;
- Possui baixo custo e é de fácil aplicação.
Desvantagens do uso do glifosato
No entanto, seu uso também pode ter desvantagens como:
- Não ser completamente agroecológico;
- Seu uso excessivo e mal manejado causa danos ao ambiente e à saúde;
- Provoca seleção de plantas daninhas resistentes.
Principais cuidados na aplicação do glifosato:
- Na aplicação de qualquer produto químico, deve-se seguir as recomendações de segurança da Norma Regulamentadora 31 para trabalho do agro (NR 31.8);
- Aplicar na forma pulverizada, diluído em tanques com água. Utilizar água de boa qualidade, limpa e cristalina, isenta de sujeiras, com baixo teor de Ca e Mg;
- Diluir o glifosato de acordo com o informado no rótulo e no receituário agronômico. Evitar super ou sub doses;
- Atentar-se às condições ambientais (vento, umidade e temperatura) e ao estádio de desenvolvimento da cultura;
- Utilizar bicos pulverizadores adequados para essas condições;
- Na finalização da aplicação, fazer a limpeza do pulverizador e descarte das embalagens de maneira adequada, seguindo as recomendações;
- Respeitar os intervalos recomendados entre a aplicação do glifosato e a ocorrência de chuva. Caso haja ameaça de chuva, a aplicação do herbicida deve ser evitada. A ocorrência de chuva nas primeiras 4 horas após a aplicação pode comprometer a eficácia do herbicida.
Obs.: Respeite esse intervalo para ocorrer a absorção e translocação suficiente do produto nas plantas daninhas, para um controle satisfatório. Fique sempre de olho nesse intervalo.
Utilização de bicos adequados (Fonte: blog Syngenta digital)
O glifosato e o manejo integrado de plantas daninhas
O ideal é fazer a rotação dos mecanismos de ação, ou seja, não utilizar somente o glifosato na lavoura, variando os produtos usados e seus sistemas de ação. Assim, é possível realizar um controle mais eficiente e prevenir o desenvolvimento de resistência das plantas daninhas.
Deve-se também utilizar o manejo na dessecação pré-plantio como aliado, uma vez com plantas daninhas resistentes na área, o custo de controle aumenta e a produção cai.
Veja algumas dicas para o manejo integrado de plantas daninhas:
Técnicas do manejo integrado de plantas daninhas (Fonte: Febrapdo)
Transgênicos e a resistência de daninhas ao glifosato
Desde 2005, com a aprovação da introdução da soja transgênica no Brasil, o controle das daninhas, principalmente, na cultura da soja se tornou quase que exclusivo e baseado em duas a três aplicações de glifosato por safra. Com esse mesmo mecanismo de ação, repetido em diversas safras seguidas e sem mudança de manejo, estimulou-se o avanço da resistência.
Para se tornar resistente, a planta precisa ser sensível, transmitir hereditariamente essa resistência e sobreviver a doses do produto, sem sofrer qualquer alteração.
Essa resistência ainda permite que algumas espécies continuem a se reproduzir, aumentando ainda mais sua infestação.
É importante lembrar que a resistência não é novidade para a agricultura brasileira. Já na década de 1990, vários produtores enfrentavam problemas associados à resistência com uso de herbicidas no manejo de plantas daninhas.
Veja como funciona:
Fonte: blog Syngenta digital
De acordo com a Embrapa Soja, atualmente 90% da área cultivada no Brasil é resistente ao glifosato. Os maiores problemas com as plantas daninhas estão no Sul do país. Estima-se que, só nessa região, aproximadamente 6 milhões de hectares sofrem com a buva, por exemplo.
Além de afetar a produção, gerando um baixo rendimento, há também uma perda econômica já que o os custos de produção com controle de plantas daninhas com outros herbicidas aumentam.
Conclusão
Nesse artigo vimos a importância do glifosato para a agricultura atual. Seu uso, é essencial no Brasil, devido à sua relevância no plantio direto, manejo importante na agricultura regenerativa
No entanto, é importante estar sempre de olho na sua correta utilização, respeitando as orientações de manejo e aplicação do glifosato.
O uso do glifosato deve ocorrer somente quando for necessário, com a formulação e dose corretas, além de fazer a rotação com outros herbicidas de diferentes mecanismos de ação, juntamente com manejos que possam ajudar ou minimizar seu uso.
Com todas estas informações, fica mais assertivo e muito mais eficiente o seu manejo de plantas daninhas com produtos à base de glifosato.
Referências
International Survey of Herbicide Resistant Weeds.
Resistência de plantas daninhas à herbicidas no Brasil e no mundo
Técnicas do manejo integrado de plantas daninhas
Embrapa Soja. Prosa Rural - Como lidar com a resistência de plantas daninhas na cultura da soja.
Henrique Servolo
Engenheiro Agrônomo, Mestre em Fitotecnia e Doutor em Engenharia florestal, todos pela Esalq/USP.
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